As Revoluções de 1930/32


Célio Pinheiro e Odette Costa, nos Conta como foi a decada de 30, devido as revoluções de 30 e 32 onde abalou em muito o desenvolvimento e a economia brasileira, Araçatuba sofreu menos.
Esta década foi muito difícil para o Brasil todo; começa com duas revoluções, que, realmente, se interpenetram. Em conseqüência, desestabilizam a normalidade, provocam mortes, acirram ânimos, alteram negativamente a economia, produzem atmosfera generalizada de medo. Araçatuba foi atingida, em grau
menor, pelas revoluções de 1.930 e de 1.932, bem como por todos os atos políticos decorrentes delas.
A continuidade dos efeitos da crise de 1.929 alcança os anos seguintes em todo o país. Segundo Rocha Pombo, O novo presidente (Washington Luís Pereira dos Santos) conseguiu vencer as últimas resistências das colunas revolucionárias nos sertões e empreender uma reforma financeira no sentido de estabilizar o mil-réis. Sua aplicação, entretanto, foi prejudicada pela crise universal de 1.929. Não conseguiu o Sr. Washington Luiz atingir o fim do seu quatriênio presidencial em virtude da Revolução que irrompeu a 3 de outubro de 1.930 nos Estados de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e da Paraíba (POMBO, 1.948: 531).
Em 01/03/1,930 houve eleição para presidente da República. Competiam o governador do Estado de São Paulo— Júlio Prestes de Albuquerque, e o do Rio Grande do Sul—Getúlio Dorneles Vargas. Ganhou, para governar o Brasil de 1.931 a 1.934, e foi proclamado presidente, Júlio Prestes. Descontentes com o resultado, e alegando fraudes (que eram comuns, principalmente porque Washington Luís apoiava Júlio Prestes na campanha para a eleição), os gaúchos levantaram-se em armas e foram apoiados por Minas e pela Paraíba.
Em 24/10/1.930, W. Luís foi deposto por uma junta militar (general Augusto Tasso Fragoso, general João Mena Barreto e contra-almirante Isaías de Noronha); em poucos dias, Getúlio Vargas recebeu o poder da junta e, em 03/11/1.930, foi empossado na chefia do Segundo Governo Provisório da República.
Em Araçatuba, a campanha para as eleições presidenciais citadas também decorreu de forma um pouco irregular, pois o P.R.P. perdeu o presidente municipal, Domingues de Almeida, que faleceu antes do pleito de março de 1.930; foi Fabriciano Juncal quem o substituiu na presidência do P.R.P local A eleição entre Júlio Prestes e Getúlio Vargas foi realizada no então Grupo Escolar José Cândido.
Com os quase dezenove mil habitantes que o município tinha, a quantidade de eleitores era bem pequena, nos bairros (que era, realmente, uma boa parte da zona rural circundando a cidade), havia somente perto de 2.000 eleitores. A cidade em si poderia ter igual número de votantes.
Assim mesmo, as brigas eram enormes. O P.R.P era o partido de Júlio Prestes e o P.D. (Partido Democrático) era o de Getúlio Vargas; isto é, situação contra oposição, P.R.P.—situação e P.D.—oposição. No final da votação, às cinco horas da tarde de 01/03/1.930, o coronel Guilherme de Sousa, em defesa do P.D, invadiu o Grupo Escolar "José Cândido" e tomou das autoridades os livros de votação. Lembremo-nos de que o voto era a descoberto e nesses livros podia-se ler quem tinha votado em quem. Sabedor da derrota de Getúlio Vargas, Guilherme de Sousa quis garantir a "anulação" dos votos do "José Cândido" (a outra seção eleitoral ficava no Fórum).
Nessa ação de apropriação indébita, aconteceram as mortes de José Faustino, do P.D. e de Pedro Coffer, do P.R.P., um atirando com revólver no outro.
Entre a eleição e a revolução (de março a outubro), para que a marcha dos revoltosos começasse em direção do Rio Grande do Sul ao Rio de Janeiro para depor W. Luis, houve o assassinato do governador da Paraíba (em Recife) Esse governador era João Pessoa, candidato a vice-presidente de G.Vargas. A revolução de trinta começou, mesmo, com essa morte.
Com a posse de Vargas na chefia da nação, a política araçatubense mudou completamente. Fabriciano Juncal foi nomeado, por telegrama de Vargas, interventor municipal. Auxiliavam-no na tarefa André Risolia, Laurindo Caetano de Andrade, Antônio Cajado de Lemos, Benjamim Bruno, Luis Curti e outros, entre os quais João Arruda Brasil.
Ainda em 1.930, em decorrência da revolução de Vargas, passou por Araçatuba um batalhão de soldados da união, vindo de Campo Grande, com mais de 800 homens, dirigidos pelo coronel Aquino Correia. Esse batalhão estava, já, em Bauru, a fim de viajar e atacar os revoltosos na capital paulista. Mudaram de partido e retornavam para o Mato Grosso, quando aportaram em nossa cidade. Aqui, cometeram muitos desmandos, procurando Manuel Ferreira Damião para matar. Não o conseguindo, promoveram arruaças contra cidadãos e empastelaram o Jornal "A Comarca".
Formou-se, como decorrência da revolução de 1.930, um clima de medo na cidade. A nomeação de administradores por telegrama, com a destituição dos que tinham sido escolhidos dentro da lei; as notícias de lutas no país; a chefia ditatorial de Vargas apoiada por militares, as atitudes de violências do 18° batalhão de Mato Grosso; a instauração de um governo forte e militar; tudo criou aquele grupo de cidadãos que passa a querer que a lei se estenda a detalhes ridículos, como a moral familiar, a economia rigidamente controlada, a educação imposta, do tipo fascista. Também em Araçatuba passou a existir essa "polícia" dos costumes e houve alguns acontecimentos lamentáveis de "punições" que mais diminuíram a população empreendedora de Araçatuba, do que consertaram as instituições.
Getúlio Vargas com o seu Rio Grande do Sul e quase todos os demais Estados brasileiros lançaram contra São Paulo uma série de agressões políticas; é que o derrotado Washington Luis era paulista e tinha apoiado Júlio Prestes. Sentindo-se acuados, os paulistas insurgiram-se e iniciaram em 09/07/1.932 a que se chamou Revolução Constitucionalista.
Essa revolução permite duas ópticas. Do ponto de vista de São Paulo, foi uma luta justa pela constituição de 1.889 que Vargas esqueceu e substituiu por leis e decretos esporádicos; estes eram editados ao sabor dos acontecimentos e das necessidades, sempre vistos na interpretação de seu grupo político; como Vargas não foi eleito legalmente, suas leis eram ditatoriais. Já na óptica dos demais Estados brasileiros e de Vargas e seus militares, o constitucionalismo de São Paulo era uma fachada para a defesa do império que os cafeicultores paulistas haviam montado com empréstimos estrangeiros, criando o enorme problema econômico da queima do café e deixando a dívida externa para o povo pagar.
Hoje, a perspectiva temporal permite que se veja razões parciais nas duas visões. São Paulo dos anos trinta era mesmo parcialmente aproveitador do Brasil através do café; e tinha, em conseqüência, criado uma espécie de feudo econômico que se impunha, de cima para baixo, ao resto do pais. Em compensação, São Paulo não fizera seu império cafeicultor só aproveitando-se do resto do país: criara, com a cafeicultura, um espírito empreendedor que os outros Estados não conseguiram apresentar e que fazia a inveja contra os paulistas. Além do que, com a concentração imigratória da Europa e da Ásia, São Paulo ia se tornando a tal de "locomotiva" do Brasil de que tanto se fala até hoje. (É óbvio que os paulistas de nascimento, os quatrocentões, também mostravam certa fibra para trabalhos e empreendimentos que também faziam a inveja dos demais brasileiros).
Do ponto de vista dos demais Estados, os argumentos favoráveis ao getulismo eram outros. Principalmente do Rio de Janeiro, que tinha a capital da República. O Constitucionalismo de 1.932, erguido como bandeira de salvação nacional pelos paulistas, era uma grande oportunidade para mostrar que as tais de treze listras da bandeira de São Paulo deveriam ser estraçalhadas e apagadas do mapa político do Brasil, era a chance de "baixar a crista" dos orgulhosos (e poderosos) paulistas.
Praticamente, a luta começou com uma passeata que os paulistanos fizeram na capital do Estado em 23/05/1.932; nela, os exaltados constitucionalistas gritavam e mostravam seu extremo descontentamento com G. Vargas no poder, em vez do eleito J. Prestes, e verberavam mais intensamente contra o sumiço da constituição de 1.889, sob as ordens ditatoriais. São Paulo, como todos os Estados brasileiros, já tinha um interventor nomeado (coronel João Alberto Barros) A polícia desse governo de intervenção avançou sobre a multidão constitucionalista e anti-Vargas. Na refrega, morreram a tiros quatro jovens; Martins, Miragaia, Draúsio e Camargo; um deles, Miragaia, era natural da vizinha Birigüi.
Imediatamente, os insurgentes paulistas trataram da capitalizar ao máximo essas mortes. Politicamente, foi criado um movimento constitucionalista que recebeu o nome de M.M.D.C, com as primeiras letras dos heróis assassinados. Desse dia até 09/ 07/1.932, foi o tempo de preparação de São Paulo para tentar guerrear Vargas e destituí-lo.
A atmosfera criada em todo o Estado de São Paulo foi extensa e profunda em torno das treze listras da nossa bandeira: ela passou a ser a bandeira do Brasil. As cidades paulistas agregaram-se ao sentido heróico dos ideais de São Paulo. Não havia, para nossos ancestrais daquele tempo, qualquer dúvida quanto aos acertos da política revolucionária e quanto aos direitos nossos.
Milhares de jovens se apresentaram para formar nosso exército revolucionário. As famílias se reuniam e doavam bens à revolução. As senhoras e moças faziam de tudo para ajudar a causa: costura, campanhas de arrecadação de bens, organização de pousos, cartazes, afinal, o apoio que a guerra interna exigia. Era um orgulho poder fazer algo, por menor que fosse, para a vitória de São Paulo.
Em Araçatuba, muitos jovens e políticos se agregaram para a organização do constitucionalismo municipal; as famílias se prontificaram a ajudar e realmente o fizeram. Alguns nomes dos homens que se destacaram são Dario Ferreira Guarita, Mário Camargo, Fabriciano Juncal, João Arruda Brasil, João Vasconcelos, José Marques de Oliveira, Aureliano Valadão Furquim, Manuel da Silva Prates, Antônio Cajado de Lemos, Paulo Leite, Ascenso Novarese, Rui de Castro Ferreira, Américo José Batista, Luis Spinelli, João Colaferro, Waldemar Alves, Bernardino Prates, Joaquim Dibo, Alziro Delletezze, José Teodoro de Lima
No prédio da Câmara municipal de vereadores, que ficava na praça Rui Barbosa, foi instalado o quartel-general. A cidade foi transformada em centro regional da revolução. Daqui saíram dois batalhões com 650 soldados e oficiais (segundo "A Comarca" de 14/08/1.932) para as batalhas em longínquos lugares do Estado de São Paulo e de outros, como Mato Grosso.
Nosso jornal "A Comarca" editou a seguinte nota (inteiramente dedicada ao "Movimento Revolucionário") Batalhão Araçatuba. Embarcou no dia 02 do corrente, às 13 horas, o batalhão Araçatuba, organizado e fardado pela M.M.D.C. e pela Casa de Costura "São Paulo Vencerá", composto de 76 voluntários, comandados pelo 2º tenente comissionado João W. Camargo e pelo sargento José Domingues, O Batalhão, antes de embarcar, desfilou pelas ruas da cidade, debaixo da aclamação entusiástica do povo. A comissão da Casa de Costura "São Paulo Vencerá" promoveu a bênção do Batalhão, cujo ato foi celebrado na Igreja Matriz pelo Rvmo. Padre Cristina, Vigário local, que pronunciou eloqüente discurso, cheio de conceitos de alto patriotismo, e ao terminar invocou para os soldados araçatubenses a proteção de Nossa Senhora Aparecida, nossa padroeira. Foram madrinhas do Batalhão as Srtas. Brigida V. Ferreira, Elisa Campos Viana, Eunice Campos Viana e Lina Couto. Araçatuba já contribuiu com 300 voluntários e reservistas, enviados ao Comando Geral parceladamente. Dentro de 05 ou 06 dias deverão estar prontos mais 100 voluntários para seguir. (A COMARCA, 04/ 08,1.932: 1).
O orgulho de participar como soldado da revolução era tão grande que pode ser medido por esta nota jornalística: Esteve ontem em nossa redação o nosso amigo J.J. Siqueira, a fim de nos comunicar que, por motivos independentes da sua vontade, não tem podido tomar parte no movimento revolucionário que hoje empolga a alma paulista. Mas, no entanto, estava trabalhando em prol da grande causa. Dentro de poucos dias deverá entregar à Comissão de Abastecimento uma carroça de cereais (A COMARCA, 04/08/1.932: 1).
A Comissão M.M.D.C, da cidade instruiu os cidadãos, que não iam nos dois batalhões para as lutas guerreiras, a serem divididos em quatro categorias: a 1ª., composta de homens de 15 a 18 anos de idade; a 2ª, de 18 a 21 anos; a 3ª, de 21 a 45 anos; e a 4ª, de 45 a 60 anos. Essas quatro faixas etárias trabalhariam na ajuda às campanhas e, principalmente, na recolha de armas de fogo da população para servir aos soldados araçatubenses, e para, se fosse preciso, defender Araçatuba de uma invasão das forças federais!
Houve centenas e centenas de pessoas que contribuíram com alimentos, bens e dinheiro. Os jornais “A Comarca” e o "O Jornal" do mês de agosto de 1.932 têm listas e listas de contribuições, indicando nomes e bens doados. Como exemplo: 10 sacas de café limpo pelos fazendeiros Francisco Martins Ferreira e João Lunardelli, das Fazendas Prado, por seu almoxarife José Rodrigues da Cruz, " 10 rezes, ou 4 cavalos e 6 éguas". "O Jornal" de 18/08/1.932 noticiava, em manchete: "O nosso município já contribuiu com mais de 1.400 sacos de cereais".
Também foi organizada uma "Cruzada do ovo", pela qual os estudantes doavam ovos para alimentar os soldados. E para a célebre "Campanha do ouro para o bem de São Paulo" "A Comarca" (25/08/1.932) traz uma grande lista de doações de jóias; como exemplo, a de Virgilina Viana, com: “1 pulseira, 1 aliança, 1 alfinete, 1 caixa de relógio, 1 fivela, pesando tudo, 28¹/² grms".
Em “O Jornal” (18/08/1.932), há a notícia de um ataque de um comando federal contra Lussanvira, na Fazenda Tietê, rechaçado por uma força com homens daqui e de Rio Preto, sob o comando de um tenente.
Também "O Jornal", de 25/08/1.932, estampa uma conclamação, na primeira página, de Nabucodonozor Vasconcelos, datada de "Araçatuba, 20/08/1.932". Por ela, há a indicação da existência de uma "Legião Negra", que pede a todos os negros do município para se engajarem na revolução: A ninguém mais do que a nós, homens de cor, pertence a defesa de São Paulo e do Brasil.
Os jornais não trazem nomes de combatentes falecidos em campanha. Em "A Comarca" de 18/09/1.932, há o pedido do Instituto de Assistência aos Órfãos da Revolução para que a população contribua com l$000 (um mil réis) mensais. Em 28/09/1.932 a revolução constitucionalista chegou ao fim; São Paulo, já sem condições, rendeu-se às "forças ditatoriais", como chamavam. Mas, até o fim de outubro daquele ano, haveria movimentação de tropas no retorno às suas cidades, como aconteceu com os combatentes de Araçatuba. Não houve retaliação pós-combates ao estado físico dos soldados de São Paulo, por parte das forças federais. De nossa cidade, só um pequeno grupo de militares, entre os quais Dario Ferreira Guarita, ficou aprisionado por pouco tempo no Rio de Janeiro.
Em 02/10/1.932, Rogaciano Vieira estampava em "A Comarca" um "Preito de gratidão" por ter sido indicado o nome de seu enteado, Virgílio Ribeiro, 2º sargento do 4º. BC. de São Paulo, morto no campo de luta, para uma rua de Araçatuba. Esta rua tem uma quadra, que vai da Rua Marechal Deodoro à Rua Regente Feijó, bem no centro da cidade .
Ficou uma mágoa de São Paulo pela perda da revolução de 1.932. Nos jornais da época, lê-se uma série de manifestações nesse sentido. Em "A Comarca" de 03/11/1.932. há um texto assinado por Severino de Oliveira, aluno da Faculdade de Direito do Rio de Janeiro, datado de 29 de outubro anterior, em que diz:
"São Paulo não foi, não está, nem será vencido!". No "Correio da Noroeste", de Bauru, de 12/06/1.933, há uma noticia breve, na primeira página sobre "uma nova ordem revolucionária dissidente".
Em Araçatuba, além de todo o esforço que tentamos retratar e quiçá de mortes, houve a substituição do prefeito: João Arruda Brasil foi trocado pelas forças federais por Rogaciano Nolasco.
As sementes do constitucionalismo permaneceram, pois em 1.933 foi organizado na capital paulista o Partido Constitucionalista. Este conseguiu grande feito logo de início: Armando de Sales Oliveira, grande estadista, foi nomeado interventor do Estado de São Paulo era civil e paulista, duas das grandes legendas que originaram a revolução de 1.932.

Nenhum comentário:

Postar um comentário